Greve recursiva

Como ocorre a cada primavera, os bancários passaram 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve…

Segundo o sindicato, para vencer a intransigência dos bancos foi fundamental a mobilização da categoria, que esse ano estava lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve…

Os objetivos da greve foram plenamente atingidos, com o pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve lutando pelo pagamento dos 23 dias em greve…

O prefeito errou

Haddad errou ao suspender a inspeção ambiental veicular. A inspeção é uma questão de saúde pública, indispensável numa cidade como S Paulo, com tantos carros produzindo poluição e se envolvendo em acidentes. É uma atitude esperada no PT, partido que consistentemente privilegia os interesses da grande indústria, dos sindicatos, dos poluidores, e dos proprietários de automóveis em detrimento da população em geral. Com os resultados que estão aí parados no trânsito para qualquer um ver.

O fim da inspeção não vai ganhar eleitores entre a assim-chamada direita lacerdista, a mais lacrimosa quanto à infração de sua liberdade absoluta de empestear o ar e infernizar as ruas da nossa cidade. Mas vai atrair a simpatia do conservadorismo profundo, das classes pouco generosas que só têm pedestres, ciclistas, e sem-viatura – jovens, mulheres, e idosos – aos quais oprimir. Quem vai notar a desproporção entre homens e mulheres nos carros e nos ônibus? Certamente não a esquerda, porque o transporte individual é direito sagrado para os bacharéis independentemente de gênero, e a segregação de gênero no transporte é coisa de gente pequena.

A inspeção vai voltar – como mostra o exemplo de todos os países ricos que se respeitam – mas com atraso, qualidade inferior e custo muito maior. Pode anotar. A oposição do PT a tudo que não foi inventado por eles vai repetir o trabalho do Cristóvão Buarque, que destruiu tudo o que foi feito pelo ministro Paulo Renato na educação, e depois teve que ser refeito pelo próprio Fernando Haddad. A sorte do PT é que o Lula não se importava com educação mas teve o bom senso de não deixar o PT acabar com a bolsa escola criada no mesmo governo Fernando Henrique. Porque o Provão é tão indispensável para a educação como a inspeção é para a saúde – numa sociedade grande e complexa a liberdade individual tem que ser regulamentada quando causa danos excessivos ao bem estar coletivo – a liberdade de poluir o ar tanto como a liberdade de poluir as mentes dos universitários com diplomas cocô.

Vitória dos interesses estreitos do complexo militar-automobilístico, como a administração Cristóvão foi uma vitória do complexo cartorial-cursinhístico. De curta duração, mas com grandes prejuízos para a sociedade. Haddad errou ao prometer e errou novamente ao cumprir a promessa de campanha.

Relatório de viagem a Ribeirão Preto

Estive na Usp em Ribeirão Preto dia 9 de outubro para apresentar poster no Simpósio Aprender com Cultura e Extensão. Não pedi afastamento publicado no diário oficial, como muitos dizem que seria necessário embora absurdo, afinal passei o dia no campus da própria universidade. Então não preciso fazer um relatório oficial que ninguém vai ler. No lugar escrevo esse relatório informal que você está lendo.

Os bolsistas não podiam ir por motivo de provas, e tive a escolha entre apresentar o trabalho e enviar um ofício justificando a ausência. Ofício, carimbo, reclamação, correção, tudo isso desperdiça esforços que poderiam ser melhor empregados. A Poli generosamente providenciou uma perua para levar os estudantes, e escolhi a alternativa que gastava menos tempo.

A viagem de ida e volta é longa. Não é muito eficiente realizar o evento num lugar distante de 90% da comunidade. Mas aproveitei para visitar a professora Elenice Mouro Varanda, que me mostrou o remanescente da floresta da Usp de Ribeirão. Um belo projeto de reflorestamento, que infelizmente foi vítima de um incêndio que destruiu uma boa parte das árvores. Não sei precisar quanto do dano pode ser atribuído ao azares da natureza, às mudanças climáticas regionais ligadas ao desmatamento e à monocultura no norte paulista, e ao aquecimento global que tem trazido invernos quentes e secos à região. Infelizmente os danos foram potencializados pela negligência dos prefeitos da Usp de Ribeirão, que apesar de repetidos avisos foram relapsos em tomar mesmo as medidas mais elementares para proteger o patrimônio público e ambiental contra os riscos do fogo. De alguma forma ou outra parte da floresta continua viva, embora a perda ambiental e científica tenha sido irreparável.

A apresentação dos posters correu bem. Estando lá, ajudei um pouco nas avaliações de trabalhos de outras unidades. Os que vi estavam muito bons, com alguns para além de excelentes. Parabéns a estudantes e orientadores em geral!

Sempre é uma boa oportunidade ouvir estudantes em uma situação informal, dentro de uma perua atravessando o interior de nosso estado. O que concluo?

Ainda faltam oportunidades para maior integração entre estudantes de diversas áreas. Existem as festas, que fazem parte da vida social mas não são eventos – como eu diria? – de conteúdo intelectual muito denso. Ações recomendadas: A universidade deveria se envolver mais em vez de deixar toda a integração entre estudantes a cargo das agremiações estudantis. Idealmente, essa integração deveria se fazer através do ensino e da pesquisa – temos que nos transformar numa universidade de fato, e deixar de pensar na graduação na Usp como um conjunto de cursos e departamentos não comunicantes. Uma maior presença de professores em eventos estudantis também me parece recomendável.

O apoio econômico aos estudantes ainda deixa a desejar. Alguns estudantes não recebem recursos suficientes da família – seja por absoluta falta de condições, seja por expectativas culturais de que ao chegarem na universidade deveriam se sustentar. Eles têm que procurar empregos, usando muito tempo que não fica disponível para os estudos. Para os politécnicos, a carga horária se torna excessiva. Ações recomendadas: A universidade deve apoiar mais os estudantes com bolsas e moradias dentro do campus, e a Poli deve pensar mais firmemente se o número de disciplinas em cada semestre é compatível com o bom aproveitamento dos estudos.

Em muitas disciplinas os estudantes percebem um descompasso entre as informações apresentadas em sala de aula, os conteúdos exigidos em provas, e a realidade da ciência e tecnologia. Eles usam as palavras “teoria”, “exercícios”, e “prática” para designar esses aspectos, mas ao meu ver não são termos adequados. O excesso de aulas “teóricas”, por natureza pouco interativas, e de avaliações através de provas – muitas vezes provas sem consulta, na era do Google!!!!, tendem a afastar os estudantes das aulas e empurrá-los para as coleções de provas do anos anteriores e para estágios mesmo que de qualidade pedagógica duvidosa. Ações recomendadas: sermos mais criativos e flexíveis quanto a formas de trabalho em sala de aula e métodos de avaliação.

O ovo

O ovo é o injustiçado da culinária. Para os vegetarianos, um produto de origem animal. Para os carnívoros, não chegou a estar vivo para ser morto, quase um derivado da soja. Barato, considerado comida de pobre. Fácil de preparar, fica para quem não tem serviçais. Sofreu um ataque rancoroso do ramo mais obscurantista da pseudo-ciência acadêmica, o nutricionismo. Daquela superstição cujo conceito fundamental, a “caloria”, não traz a menor relação com a alimentação – que inventou a gordura vegetal hidrogenada para substituir a manteiga, a sacarina para acabar com o açúcar. Ovo é neutro, pareve, não é nem carne, nem leite, nem vegetal.

O ovo é saboroso, barato, e kosher.

Poleiro de orquestra

Não sei o que é mais inacreditável: a genialidade do Beethoven; o talento do Nelson Freire e da regente e músicos da orquestra do estado; ou pagar 14 réis pelo ingresso no melhor lugar do teatro meia hora antes do concerto.

É que a Sala S Paulo, na estação Sorocabana, tem um poleiro atrás da orquestra, no setor que eles chamam “coro”. Você fica colado aos músicos, olhando para a regente, dá para acompanhar a partitura dos trombones. É o melhor lugar, quem como eu mal sabe tocar vitrola quase se convence que entende de música.
Os ingressos no poleiro custam 1/5 do preço, e mesmo assim não esgotam. Porque será? A explicação mais pedestre é falta de hábito dos frequentadores. Não é convincente: a sala já não é nova, e a diferença de preço seria suficiente para mudar os hábitos.
Uma explicação pseudocientífica seria a acústica. Verdade que o piano abre para o lado da frente, e os metais ficam amplificados para quem senta atrás. Mas Beethoven não carrega nos metais, no Prokofiev os trombones até ajudam, e a arte do Nelson Freire é maior que a tampa do piano. Improvável que muita gente note a diferença entre sentar num lado ou outro. Quem tem esse discernimento certamente vai preferir ver a orquestra do ponto de vista dos músicos.
Uma melhor explicação é social. O frequentador dos concertos quer ser visto; não quer entrar pela porta dos fundos, de serviço, sentar junto com os músicos, quasi-funcionários. E teme que a localização pouco usual seja menos prestigiosa, denuncie falta de sofisticação, talvez até por não confiar no próprio discernimento acústico.
A imagem da orquestra cercada pela audiência lembra a arquitetura de uma sinagoga sefaradi. Não considero provável que seja um receio atávico da inquisição que afasta o apreciador da boa música de uma barganha, mas nunca se sabe.
Fica a dica para quem não receia perder casta nem a acusação de cripto-judaísmo: vá ao concerto, sai mais barato que o cinema, e tem metrô.

Roubaram as rodas do ônibus

Ou será que o fantasma do Quércia acabou com a linha Metrô V Madalena-Rio Pequeno, que me trazia para a Usp e estava sempre cheio? Fui olhar hoje de manhã, e o ponto sumiu. O site da Sptrans dá informações contraditórias e incorretas sobre a linha. A impressão é que foi cancelada sem aviso. Melhor, vim a pé. São só uns 30 minutos até entrar no campus.

Só que o transporte coletivo interno na Usp piorou muito em alguns aspectos, apesar do grande gasto em novos ônibus e linhas, ou até por causa dele. Devido ao trajeto longo, redundante, e irracional, os ônibus estão sempre cheios em alguns trechos e tem poucos usuários em outros. Vindo da ponte sobre o Rio Pinheiros, onde sobem muitos passageiros por causa da estação de trem do outro lado do rio, agora só há a opção da linha circular 1 – a linha circular 2 da Sptrans quando passa no ponto da estação tem sentido para fora Usp, e a linha circular 2 interna está com frequência e número de carros muito reduzida.

A lotação dos ônibus é desnecessária, porque é causada pelo mau traçado dos trajetos e não pelo excesso de passageiros. Para agravar o problema, o embarque e desembarque nos novos ônibus é muito lento, porque os passageiros precisam passar pelo chiqueirinho janista e pela catraca, mesmo que seja só para passar o cartão Usp que dá direito a passagem gratuita. Nos circulares internos antigos, inclusive nos poucos que ainda circulam, a entrada e saída é livre, tornando o embarque muito mais rápido. Os novos, devido aos atrasos no embarque, tendem a passar todos juntos, deixando longos intervalos sem serviço.

Quer dizer, para cobrar a passagem da meia dúzia de usuários que não é da Usp, torna-se necessário aumentar muito o número de ônibus para compensar o tempo perdido com o embarque.

Não adianta só gastar dinheiro público. É preciso melhor engenharia e mais competência do que estão sendo demonstrados na administração da universidade.

Imagine o PT com maioria no congresso e um presidente tucano

Para entender a paralisação do governo dos Estados Unidos: imagine o PT com maioria no congresso e um presidente tucano.

O que o PT faria? Possivelmente, diria “NÃO”, até paralisar tudo. Porque isso não acontece no Brasil? Porque uma boa fração do congresso são partidos e políticos não-ideológicos, sem interesse em que as coisas deixem de funcionar. A turma leninista, do quanto pior melhor, é reduzida – setores do PT, os partidos mais à esquerda, e talvez algum grupo de direita.

Nos Estados Unidos, os leninistas controlam o Partido Republicano. A liderança do partido impede as votações – porque se o congresso votasse, as propostas do presidente passariam, com apoio do Partido Democrata e da parte patriota da oposição.

Pense nisso na próxima vez que alguém reclamar que os partidos no Brasil não são ideológicos.