Colegas me enviaram um artigo do vice-diretor da Poli sobre como era bom o ensino de engenharia antigamente. Esse saudosismo dos professores da Usp me enche a paciência. Minha resposta vai aqui.
1 – Eu não sei se o ensino de engenharia no Brasil na época da ditadura era tão maravilhoso como o Cardoso fala. Se fosse, a gente teria passado para uma liderança mundial sem precisar de impostos de importação e reservas de mercado. Em vez disso com a abertura dos mercados percebemos que tinham deixado a gente para trás.
2 – Também não sei se os professores de engenharia eram assim tão preparados. Ninguém publicava nada, menos ainda em periódicos internacionais. Então há pouco registro dessa excelência, se é que houve. É só a opinião dos colegas.
3 – Também não sei se as escolas públicas eram assim de altíssimas qualidades. Havia alunos excelentes, mas era uma minoria pequena em um país cheio de analfabetos. A escola pública que o pessoal da esquerda e da direita exalta alcançava poucos. Hoje todas as crianças pelo menos vão à escola. Se não aprendem muito, será que esses professores deles formados nas escolas de antigamente eram assim tão bons?
4 – A escola de engenharia sempre lutou contra inovações. Oss curso são cheios de inutilidades desinteressantes. O desinteresse dos estudantes então é culpa de todos, menos das escolas tradicionais? Aliás na Poli engenharia civil e eletrotécnica continuam tão pouco procuradas como no nosso tempo. Por isso mudaram de novo a opção para o vestibular, com apoio total do autor do artigo. Desinteresse e evasão são culpa de quem?
5 – Professor ganha pouco mesmo. Em todos os níveis. Mas vamos falar um pouco da Usp, que tem 5 mil professores. Cada um trabalha no máximo umas mil horas por ano nas atividades-fim da universidade – as “billable hours” para quem já trabalhou em consultoria – a saber, ensino e pesquisa. O resto são atividades que não podem ser atribuídas ao cliente, que é o aluno e o contribuinte, tais como reuniões internas, ou projetos pagos diretamente. Com um orçamento de 2.5 bilhões, dá uns 500 réis por hora. Uma remuneração digna de uma boa consultoria. Se o salário é baixo, é porque o dinheiro é mal gasto, com burocracia, funcionários pouco produtivos, greves diversas, aposentadorias precoces, escrevendo emails como esse, sei lá mais o quê. No ensino médio pode ser uma história diferente, mas na universidade haveria dinheiro para remunerar os professores bem. Se os professores das universidades públicas ganham pouco é porque eles – que administram as universidades – preferem gastar tempo e dinheiro do contribuinte com outras coisas.
6 – Note que o artigo identifica um problema no ensino médio e termina justamente pedindo mais investimento nas faculdades de engenharia. Os professores universitários sempre dizem isso: para melhorar o ensino no Brasil, é preciso dar mais dinheiro para as universidades. Non sequitur, e não funciona.
#prontofalei